ANÁLISE: Entre o Compromisso com o Povo e a Submissão Partidária

Por Jornal Creator 



Na recente cerimónia de indução dos deputados da Frelimo, realizada na Escola Central do Partido, o presidente da formação, Daniel Chapo, lançou um apelo — ou, melhor dizendo, uma exigência — aos parlamentares da sua bancada: compromisso com as necessidades do povo. À primeira vista, a declaração soa louvável, quase como um grito de renovação. Mas, ao examinar cuidadosamente o conteúdo e o contexto do discurso, o que se percebe é um reforço da velha lógica de submissão à hierarquia partidária, mais do que uma real abertura ao debate plural e democrático.

Chapo destacou a importância de "manter firmeza e clareza" para mudar o cenário do país, exigindo dos deputados fidelidade total aos princípios da Frelimo. No entanto, essa ênfase na "disciplina partidária" levanta uma questão essencial: como conciliar o verdadeiro compromisso com as necessidades populares com a rigidez da fidelidade ideológica? Em regimes democráticos saudáveis, o papel dos deputados é, antes de tudo, representar os cidadãos — e isso inclui o direito de questionar, criticar e até contrariar as diretrizes do partido quando estas não correspondem aos interesses do povo.

Ao exigir que os parlamentares "dominem as matérias" e "vencem o debate pela força da lógica", Chapo propõe um ideal parlamentar meritocrático. Mas essa retórica entra em choque com a prática reiterada da Frelimo de bloquear, silenciar ou marginalizar vozes críticas — inclusive dentro da própria bancada. Deputados que ousam divergir são frequentemente punidos com ostracismo político ou afastamento de comissões-chave.

É também importante destacar o tom imperativo de frases como “deputado deve inspirar confiança” e “ser agente de soluções”. São princípios importantes, sim — mas na ausência de liberdade de pensamento e ação, soam mais como slogans do que como metas realizáveis. Um deputado que não pode votar de acordo com a sua consciência dificilmente poderá representar com fidelidade os seus eleitores.

Em suma, o discurso de Daniel Chapo revela mais sobre os limites da democracia interna na Frelimo do que sobre qualquer renovação de compromisso com o povo. A exigência de lealdade absoluta ao partido está em contradição direta com o pluralismo democrático e com a independência que o Parlamento deveria garantir. O povo moçambicano não precisa apenas de deputados comprometidos — precisa de deputados livres. E isso, infelizmente, ainda parece distante do horizonte traçado pela atual liderança partidária.


Postagem Anterior Próxima Postagem