Apesar das informações amplamente divulgadas nos últimos dias por vários órgãos de comunicação social, que davam conta da libertação condicional de Ângela Leão — esposa do ex-chefe dos serviços secretos moçambicanos, Gregório Leão — a verdade é que, até ao momento, ela continua presa, contrariando o que se esperava após o parecer do Tribunal Supremo (TS).
Ângela Leão foi condenada a 11 anos de prisão maior no âmbito do processo das dívidas ocultas, um dos maiores escândalos de corrupção da história recente de Moçambique. Contudo, em resposta a um recurso apresentado pela sua defesa, o Tribunal Supremo ordenou que lhe fosse concedida a liberdade condicional, considerando que, por força do Código Penal de 2014 — o qual deve ser aplicado ao caso — tal benefício pode ser concedido após o cumprimento de metade da pena.
No acórdão datado de 15 de Abril, os juízes conselheiros do TS afirmam que a aplicação de uma lei posterior que agrave as condições da liberdade condicional violaria os princípios da legalidade, segurança jurídica e proteção da confiança. Assim, decidiram revogar o despacho que negava o pedido da defesa de Ângela Leão, ordenando ao tribunal inferior que voltasse a apreciar o caso à luz da legislação penal anterior.
Com base nesse entendimento do Supremo, outros dois condenados no mesmo processo, Cipriano Mutota e Fabião Mabunda, beneficiaram já da liberdade condicional. Os dois viram os seus pedidos aprovados e foram libertos recentemente da Cadeia do Língamo.
Contudo, o caso de Ângela Leão tem trilhado um caminho diferente. Apesar da existência do acórdão do TS que lhe é favorável, o Tribunal Judicial de Recurso (TSR), até à data, manteve-se em silêncio e não comunicou atempadamente à Direcção da Cadeia Civil os trâmites necessários para a sua soltura. Fontes próximas da família e do processo confirmaram que ela permanece privada de liberdade, o que levanta dúvidas sobre os critérios e prazos que estão a ser aplicados.
Neste momento, decorrem diligências para a execução da decisão do TS, e fontes indicam que a libertação de Ângela Leão e de outros arguidos que se encontram em circunstâncias semelhantes poderá ocorrer a qualquer momento.
Este novo capítulo do processo das dívidas ocultas reacende o debate sobre a coerência e equidade na aplicação das decisões judiciais, além de expor possíveis entraves administrativos ou judiciais que ainda permanecem por esclarecer.