Moçambique já traça os primeiros passos rumo ao seu próximo grande levantamento demográfico. O Instituto Nacional de Estatística (INE) anunciou, esta segunda-feira, que o Censo Populacional de 2027 custará ao país mais de 7 mil milhões de meticais — o equivalente a cerca de 110 milhões de dólares norte-americanos. O valor, considerado astronómico por muitos analistas e cidadãos, levanta preocupações sobre a real capacidade de gestão e prioridades do Estado.
Durante o lançamento oficial do processo, o INE explicou que o montante será alocado à remuneração dos recenseadores e supervisores, aquisição de equipamento informático, logística da recolha de dados e tratamento estatístico. Estima-se que o país terá cerca de 36 milhões de habitantes em 2027, o que coloca o custo por cidadão recenseado em cerca de 230 meticais — um valor que, ironicamente, ultrapassa o custo da emissão de um Bilhete de Identidade (BI), documento essencial para a vida civil.
A primeira-ministra, Benvinda Levi, destacou que o Censo de 2027 será o primeiro a recorrer fortemente a tecnologia digital, prometendo maior eficiência, precisão e transparência. “Estamos a investir na modernização do sistema estatístico nacional”, disse Levi, defendendo o orçamento como “um investimento necessário para o desenvolvimento”.
Contudo, fora das salas oficiais e dos discursos ensaiados, as vozes críticas começam a crescer. Num país onde grande parte da população enfrenta dificuldades extremas de acesso à saúde, educação, emprego e habitação condigna, o anúncio de um gasto tão elevado num único exercício levanta questões sérias sobre as prioridades governamentais.
“É um absurdo gastar mais de 7 mil milhões num censo, quando temos escolas sem carteiras e hospitais sem medicamentos. Estamos a digitalizar estatísticas, mas a realidade do povo continua analógica e dolorosa”, afirmou um economista independente, que preferiu o anonimato.
Para muitos cidadãos, este anúncio representa mais uma oportunidade para elites políticas e administrativas inflarem orçamentos e colherem dividendos em esquemas opacos de aquisição pública e contratação de serviços. Há receios de que, mais uma vez, a tecnologia seja apenas um pretexto moderno para justificar gastos injustificáveis.
A poucos anos do arranque do processo, a grande questão que fica é: vale mesmo a pena gastar tanto num censo, enquanto o país permanece mergulhado em desigualdades e crises sociais persistentes?
O povo moçambicano, já habituado a promessas sofisticadas com resultados modestos, assiste atento. Porque contar pessoas, por mais importante que seja, não pode custar mais do que cuidar delas.
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sociedade