O influente académico e Reitor da Universidade Técnica de Moçambique, Severino Ngoenha, lançou duras críticas ao Diálogo Nacional Inclusivo em curso, afirmando que a exclusão do ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane torna o processo sem "absolutamente nenhum sentido". Para Ngoenha, Mondlane é a "cara mais representativa das exigências do povo" que motivaram os protestos pós-eleitorais e, consequentemente, a própria existência do diálogo.
Falando na Conferência Anual do Observatório do Meio Rural, Ngoenha revelou ter confrontado diretamente o Presidente da República, Daniel Chapo, sobre esta ausência. "Senhor Presidente, a razão da existência de um diálogo, em Moçambique, foram as manifestações e a cara mais representativa (...) é o Venâncio. Não faz absolutamente nenhum sentido que vocês façam esse diálogo sem a presença dele", relatou o académico.
Segundo Ngoenha, a resposta de Chapo foi que a composição da comissão do diálogo foi uma decisão do Parlamento, baseada na representação partidária. O Presidente terá sugerido que só a Assembleia da República poderia alterar a lei para incluir outras forças políticas, uma resposta que o académico considerou evasiva.
Bastidores de um Processo "Desvirtuado"
Severino Ngoenha revelou ainda que o documento base que deu início às conversações foi, na verdade, construído a partir dos famosos "20 pontos" de Venâncio Mondlane, introduzidos pelo movimento "Manifesto Cidadão", do qual faz parte. Contudo, o processo foi-se desvirtuando.
"Pouco-a-pouco, fomos perdendo o controlo dele [do documento], quando foi para a Comissão Política, para o Comité Central e começaram a fazer mudanças", narrou, acrescentando que alertou os partidos da oposição para não se deixarem "arrastar" por uma iniciativa presidencial, defendendo um diálogo entre iguais. "À medida que ia entrando nas instituições, foi nos escapando pela mão. (...) Aquilo foi andando e apareceu como uma proposta presidencial", lamentou.
O académico admitiu que o caminho atual "não é o ideal", mas que ainda representa uma possibilidade de lutar por reformas. As suas revelações contrastam fortemente com o discurso oficial do Presidente Chapo, que afirma que no diálogo "não há excluídos" e que "ninguém precisa de fazer requerimento" para participar — isto enquanto a carta de Venâncio Mondlane, enviada em agosto a solicitar a sua inclusão, continua sem resposta.