O uso de tratores para transportar pessoas nos distritos moçambicanos, defendido por António Matos como uma “solução criativa”, está a ser fortemente criticado como uma perigosa normalização do abandono institucional e da exclusão social.
Embora apresentado como inovação, o trator é um equipamento agrícola, e não um meio de transporte coletivo. Adaptá-lo para esse fim é assumir que os cidadãos das zonas rurais não têm direito à mesma qualidade de serviços que os habitantes das cidades. É institucionalizar a desigualdade, não resolvê-la.
Mais grave ainda, esta medida revela um Estado que desistiu de planificar, investir e governar com justiça. Em vez de garantir estradas transitáveis e transporte público regulado, o governo opta por regulamentar o improviso e a precariedade.
A retórica de que “dignidade não é andar num veículo bonito” é criticada como cínica. Para os críticos, dignidade é ter acesso a transporte seguro, confortável e digno — e não depender de carroçarias improvisadas em tratores.
Também há suspeitas sobre os reais beneficiários desta medida: quem lucra com a compra em massa desses tratores? Há indícios de contratos públicos opacos que podem estar a beneficiar membros da elite política, sob o disfarce de “solidariedade com as zonas remotas”.
A crítica conclui que não se trata de falta de meios, mas de prioridades políticas: enquanto há recursos para carros de luxo e voos em classe executiva nas capitais, o interior continua esquecido.
Aceitar tratores como transporte não é governar — é desistir de governar. É declarar, com silêncio cúmplice, que o povo pobre não merece mais que improviso.