Por Jornal Creator
A recente nomeação de Albino Forquilha, presidente do PODEMOS, como Conselheiro de Estado em Moçambique escancarou o jogo político que se desenha nos bastidores do poder, e acentuou a marginalização de Venâncio Mondlane, uma das vozes mais expressivas e controversas da oposição no país.
Mondlane, ex-candidato presidencial e figura central nas manifestações populares pós-eleições, foi literalmente empurrado para fora da engrenagem institucional que deveria, por mérito democrático, acolhê-lo. A Constituição moçambicana é clara: o segundo candidato mais votado nas eleições presidenciais integra, por direito, o Conselho de Estado. Mas até hoje, Mondlane não foi nomeado — uma omissão que soa menos como descuido e mais como estratégia deliberada.
A REPRESSÃO DE QUEM PROTESTA
Desde outubro de 2024, quando os resultados eleitorais foram anunciados sob fortes suspeitas de fraude, Moçambique mergulhou num ciclo de manifestações, repressão policial e censura política. Mondlane, que representava a coligação CAD (Coligação Aliança Democrática), surgiu como o porta-voz da indignação popular. Com discursos firmes e presença nas ruas, encarnou a frustração de uma juventude sem emprego, de comunidades esquecidas, de um povo cansado de promessas.
Ao invés de ouvir essas vozes, o Estado respondeu com silêncio e violência. As manifestações foram contidas com gás lacrimogéneo e balas de borracha, e Mondlane, forçado ao exílio temporário, só regressou ao país em janeiro de 2025. Ainda assim, continua a ser tratado como persona non grata pelos corredores do poder.
A TRAIÇÃO POLÍTICA DO PODEMOS
A situação tornou-se ainda mais grotesca com a ruptura entre Mondlane e o partido PODEMOS — que inicialmente o acolheu como candidato presidencial após o veto da coligação CAD pelo Conselho Constitucional. Quando o partido decidiu tomar posse dos assentos parlamentares mesmo diante das denúncias de fraude, Mondlane rompeu com o grupo, acusando Albino Forquilha de trair o povo em troca de privilégios políticos.
Não surpreende, portanto, que Forquilha tenha sido premiado com um assento no Conselho de Estado — um gesto que carrega o peso simbólico de quem está disposto a negociar com o sistema. Já Mondlane, por manter-se firme em sua denúncia contra o status quo, é excluído. É a velha lógica: quem grita não é ouvido, quem cede é acolhido.
O QUE ESTÁ EM JOGO?
A exclusão de Mondlane do Conselho de Estado não é apenas uma injustiça pessoal. Ela representa o silenciamento institucional da dissidência política, um ataque direto à democracia participativa. O governo moçambicano demonstra, com esta decisão, que prefere dialogar com opositores “seguros” do que enfrentar os incômodos da crítica legítima.
O povo moçambicano, no entanto, está a observar. A memória das manifestações, da repressão, da esperança sufocada, ainda está viva nas ruas. E Mondlane — com ou sem título oficial — permanece como símbolo de resistência.
Moçambique vive um momento decisivo. A democracia não se mede apenas pelo número de votos, mas pela forma como trata os seus opositores. Enquanto a elite política fecha portas a vozes como a de Venâncio Mondlane, fecha-se também à possibilidade de construir um país mais justo, mais plural e verdadeiramente democrático.
Categoria:
OPINIÃO | CRÍTICA POLÍTICA