REDAÇÃO ESPECIAL: Quem Está a Sabotar o Futuro das Crianças em Gaza? Corrupção, Fraudes e o Colapso do Sistema Educativo.
A província de Gaza, outrora considerada um bastião de resistência e disciplina no setor educativo, está agora no centro de um escândalo que levanta sérias dúvidas sobre a integridade das instituições públicas locais. A denúncia feita recentemente pela Governadora Margarida Mapandzene Chongo sobre gestores escolares que falsificam os números de matrículas para desviar fundos públicos, é apenas a ponta do iceberg de um sistema corroído por práticas fraudulentas, má gestão e negligência.
FRAUDE NAS MATRÍCULAS: UM ESQUEMA SILENCIOSO
De acordo com a governadora, vários gestores escolares estão a inflacionar os números de alunos matriculados nas suas escolas. O objetivo é claro: garantir uma fatia maior dos fundos do Apoio Direto às Escolas (ADE), um programa que visa melhorar a qualidade do ensino através da transferência de recursos diretamente às unidades escolares. Esta prática criminosa compromete a planificação e distribuição equitativa de recursos e evidencia um sistema onde os números falam mais alto que a ética.
O diretor provincial de Educação, Ferrão Bambo, anunciou que já estão em curso inspeções para detetar e responsabilizar os infratores. No entanto, críticos apontam que tais medidas são muitas vezes paliativas e não abordam as causas estruturais do problema: impunidade crónica e fraca fiscalização.
UM HISTÓRICO DE IRREGULARIDADES
O problema da corrupção no setor educativo de Gaza não é novo. Em 2014, sete professores admitiram envolvimento numa fraude nos exames da 10ª e 12ª classes. Utilizando SMS, os educadores enviavam respostas aos alunos durante os exames em cinco distritos diferentes: Bilene, Chibuto, Chókwè, Xai-Xai e Mandlakazi. A fraude levou à anulação dos exames e forçou o governo a organizar provas extraordinárias, comprometendo a credibilidade do sistema de avaliação.
Já em 2009, professores do distrito de Bilene denunciaram dirigentes do setor por uso indevido de fundos públicos, incluindo pagamento de ajudas de custo por deslocações fictícias. Os docentes também relataram atrasos sistemáticos na progressão de carreira, desmotivando o corpo docente e criando um ambiente de trabalho hostil.
FALTA DE INFRAESTRUTURAS E NEGLIGÊNCIA ADMINISTRATIVA
O cenário agrava-se com a falta gritante de infraestruturas escolares. Dados de 2022 revelam que a província tinha um défice de mais de 1.800 salas de aula, forçando milhares de crianças a estudar debaixo de árvores ou em salas improvisadas e superlotadas. Este défice não é apenas um reflexo de insuficiência orçamental, mas também de má alocação e gestão dos recursos existentes.
Em fevereiro de 2025, inundações no distrito de Limpopo obrigaram à suspensão de aulas em sete escolas, afetando mais de 500 alunos. Em vez de existir um plano de contingência, como exige a legislação educacional moçambicana, as autoridades reagiram tardiamente, expondo a fragilidade da resposta institucional a crises.
COBRANÇA ILEGAL DE TAXAS: OUTRA CAMADA DE EXCLUSÃO
Outro episódio alarmante ocorreu na Escola Básica de Muawasse, onde foi denunciada a cobrança ilegal de taxas de "guarda escolar", prática que viola as diretrizes do Ministério da Educação. Muitas crianças foram impedidas de assistir às aulas por não conseguirem pagar os valores exigidos, aumentando o risco de abandono escolar precoce.
FALTA DE RESPONSABILIZAÇÃO E IMPUNIDADE
Apesar das constantes denúncias, poucas ações judiciais foram tomadas contra os responsáveis. A impunidade reforça a reincidência e mina a confiança da população no sistema. Muitos gestores e professores envolvidos em irregularidades continuam a exercer funções, sem qualquer sanção visível.
UM APELO POR REFORMAS URGENTES
A crise no setor da educação em Gaza é estrutural e exige reformas profundas, que vão além de inspeções pontuais. É necessário:
- Reforçar os mecanismos de controlo e fiscalização dos fundos escolares;
- Estabelecer sistemas de denúncia seguros e eficazes para que os próprios professores e pais possam reportar abusos;
- Garantir transparência na gestão escolar, com envolvimento direto das comunidades locais;
- Responsabilizar criminalmente os gestores corruptos, sem protecionismo político.
A educação deve ser o pilar de qualquer sociedade que se pretenda desenvolvida. Enquanto os fundos públicos continuarem a ser tratados como propriedade privada de alguns gestores, o futuro das crianças moçambicanas, especialmente em Gaza, continuará a ser hipotecado.