Apesar dos milhões de dólares canalizados para o norte de Moçambique sob o pretexto de desenvolvimento rural e resiliência comunitária, comunidades como as de Cabo Delgado continuam sem ver melhorias reais em suas vidas. O projecto MOZNORTE, lançado em 2021 com apoio do Banco Mundial, é apenas o exemplo mais recente de uma longa lista de iniciativas que nascem com promessas e morrem sem impacto, envoltas em má gestão e suspeitas de corrupção.
MOZNORTE: MILHÕES EM NOME DO POVO, MAS POUCO CHEGA
Com um financiamento global de 150 milhões de dólares, o MOZNORTE tinha como missão fortalecer meios de subsistência, agricultura e infraestruturas locais. Porém, em Cabo Delgado, beneficiária de cerca de 600 mil dólares, líderes comunitários afirmam que o que chegou não condiz com o valor anunciado:
- Fontes de água que não funcionam;
- Escolas prometidas ainda por construir;
- Insumos agrícolas em quantidade e qualidade insuficientes.
Segundo um activista local, “o povo é apenas o pretexto para captar o dinheiro. Depois disso, desaparecemos do plano”.
CASOS ANTERIORES DE FRACASSO E MÁ GESTÃO
Este não é um caso isolado. Moçambique tem um histórico marcado por escândalos ligados à má aplicação de fundos doados por instituições multilaterais.
1. FUNDO DE GESTÃO DE CALAMIDADES – 2022
Em Dezembro de 2022, o Banco Mundial suspendeu o financiamento ao Fundo de Gestão de Calamidades após descobrir um desvio de mais de 32,5 milhões de meticais. Os valores destinavam-se à resposta humanitária a desastres naturais, mas foram desviados para contas privadas e despesas pessoais.
📎 Fonte: VOA – Voz da América
2. PROJECTOS DE REASSENTAMENTO EM TETE – CASO VALE (2011–2015)
Durante a instalação da mineradora Vale em Moatize, Tete, foram prometidos reassentamentos com casas modernas, escolas e clínicas, num projecto apoiado por instituições financeiras internacionais.
Porém, muitos reassentados denunciaram:
- Casas mal construídas, com fissuras;
- Falta de água potável e energia elétrica;
- Perda de terras férteis, sem alternativas sustentáveis.
O caso foi denunciado por ONGs como Justiça Ambiental e Friends of the Earth.
3. FUNDO DE APOIO SOCIAL (FAS) – 2010s
O FAS, financiado por diversos doadores incluindo o Banco Mundial, visava construir pequenas infraestruturas (escolas, postos de saúde) em zonas rurais. Relatórios internos e avaliações externas apontaram para:
- Obras inacabadas;
- Contratos viciados;
- Ausência de mecanismos de participação comunitária.
4. DÍVIDAS OCULTAS – 2016
Embora não seja um projecto de desenvolvimento rural, o escândalo das dívidas ocultas é talvez o maior símbolo da captura do Estado por elites. Em 2013 e 2014, o Governo contraiu ilegalmente mais de 2 bilhões de dólares em empréstimos escondidos, justificando-se com investimentos navais e segurança marítima — que nunca se concretizaram.
O Banco Mundial e FMI suspenderam o apoio financeiro directo ao país. O povo continua a pagar essa dívida até hoje, com cortes em serviços públicos e agravamento da pobreza.
📎 Fonte: Relatório do Banco Mundial sobre Corrupção e Crescimento (2023)
CONCLUSÃO: Quando a Ajuda Se Transforma em Negócio de Elite
A história repete-se: projectos criados para melhorar a vida das populações acabam beneficiando consultores, elites políticas, empresas contratadas sem concursos públicos, e outros intermediários.
Em Cabo Delgado, onde o sofrimento da guerra, do deslocamento e da pobreza é real, usar o povo como justificação para captar fundos — e depois abandoná-lo — é uma forma grave de violência institucional.
Sem mecanismos de transparência, fiscalização comunitária, auditorias públicas e punição de desvios, o risco é que projectos como o MOZNORTE apenas alimentem o ciclo da dependência e da desigualdade.
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